sábado, 15 de agosto de 2009

CONTROLE SOCIAL NA POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO, É POSSÍVEL?

Controle social da midia: por que não discutir o assunto?
Venicio A. de Lima *
No 2º Encontro Nacional de Comunicação da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), realizado recentemente, em São Paulo, o subchefe executivo da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) informou que é posição de governo não apoiar a inclusão do controle social da mídia entre os temas a serem discutidos na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom).

Como a Comissão Organizadora é tripartida, sabendo-se que a interdição do debate sobre o controle social da mídia é defendida desde sempre pelos setores empresariais, a se confirmar a posição de governo ela significaria que o tema estará ausente da 1ª Confecom – uma vez que, sozinhos, os representantes da sociedade civil não teriam votos suficientes para garantir sua inclusão.

O que significa controle social da mídia e por que os empresários e, aparentemente, importantes setores do governo não querem sequer que o tema seja debatido?

Controle social

Na sociologia, o conceito de controle social é muito próximo da idéia de padrões culturais ou regras de conduta ou conjunto de normas que "guiam e constrangem os indivíduos em suas relações com os outros membros da sociedade". Alguns tipos de controle social são os costumes, a opinião pública, a religião, a moral e a educação. Na teoria funcionalista, o controle social dos "desvios" permite o reequilíbrio permanente do sistema social, enquanto na sociologia do conflito ele serve a interesses de classe.

Na ciência política contemporânea, por outro lado, a idéia de controle social aparece associada à descentralização administrativa e a formas de democratização da gestão pública. A palavra, em inglês, accountability é a que mais se aproxima do conceito.

A própria dificuldade de se encontrar um equivalente em português para accountability expressa a ausência no Brasil, país com forte tradição de Estado patrimonialista, de um conceito que represente a responsabilidade do poder público (ou daqueles que executam serviços públicos por sua concessão) de prestar contas de ações implementadas (ou não) em nome do interesse público aos seus cidadãos.

A idéia accountability como controle social foi um princípio inserido na Constituição de 1988 que vem sendo adotado, com relativo sucesso, em vários setores de políticas públicas, sobretudo na educação e na saúde. Nestes setores, a idéia está totalmente incorporada e fala-se de controle social da educação ou de controle social da saúde sem que ninguém tenha dúvidas de que se trata de um mecanismo democrático de gestão que funciona normalmente no estado de direito.

O MEC, por exemplo, define controle social como "a participação da sociedade no acompanhamento e verificação das ações da gestão pública na execução das políticas púbicas, avaliando os objetivos, processos e resultados" (ver aqui).

Sem regulamentação

Quando se fala em controle social da mídia, por óbvio, refere-se diretamente apenas àqueles serviços públicos de radiodifusão sonora de sons e imagens, exercidos diretamente pela União ou cuja concessão foi outorgada à iniciativa privada.

Como na educação e/ou na saúde, trata-se, portanto, da criação de mecanismos de accountability que permitam à sociedade, através de representantes democraticamente eleitos, acompanhar, verificar e avaliar se as políticas públicas do setor, executadas diretamente pela União ou por concessionários dos serviços públicos por ela outorgados, cumprem as normas definidas na Constituição e nas leis.

Uma referência inicial para accountability da mídia seria o capítulo 5 – "Da Comunicação Social" – da Constituição. Lá estão: a proibição de monopólios ou oligopólios dos meios de comunicação; os princípios para a produção e a programação no rádio e na televisão – finalidades educativas; promoção da cultura regional; estímulo à produção independente; regionalização da produção cultural, artística e jornalística; respeito a valores éticos e sociais da pessoa e da família; o princípio da complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal.

Sabe o leitor(a) que nenhuma dessas normas constitucionais, que têm já mais de 20 anos, foi sequer regulamentada pelo Congresso Nacional e que, portanto, se transformaram em "letra morta", sem qualquer eficácia legal. Sabe também que o Conselho de Comunicação Social – órgão auxiliar do Congresso Nacional – regulamentado por lei, simplesmente deixou de funcionar desde dezembro de 2006.

O porquê da interdição

Desta forma, não é difícil compreender o porquê de o controle social da mídia, ao contrário do que já ocorre em relação a outros direitos fundamentais como a educação e a saúde, venha sendo sistematicamente interditado, inclusive, para o debate. Parece, agora, que os grupos empresariais da radiodifusão estão tentando dar um passo além e vetar até mesmo a inclusão do tema na Confecom.

Espera-se que os setores do governo envolvidos na organização da 1ª Confecom se dêem conta da injustificável assimetria que existe na accountability de diferentes setores de políticas públicas e apóiem a inclusão do controle social da mídia como um de seus temas. Ou não se pode sequer debater?

Artigo publicado no Observatório da IMprensa

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